segunda-feira, 11 de junho de 2012

Boipeba, Bahia, Brasil, Janeiro de 2007.

Boipeba, Bahia, Brasil, Janeiro de 2007.



Tinha jasmim no quintal.
Flor de cheiro, que se misturava entre coqueiros, guaiamuns e hibiscos.
Tinha cheiro também de gente nova.
Gente com olhares curiosos e de benção.
Traziam cores para o varal, saliva para as delícias,
sons para compartilhar e silêncios para completar.
A vontade de se encontrar, numa busca por si, não se findava.
Tudo se confundia com o desejo de juntar, comungar.
Areia fofa e quente enrijecia as pernas,
e a pele se queimava no mesmo percurso.
Tudo para ir. Ir ao encontro do mar e dos amigos feitos.
E ir tão longe era prazer, era desejo de sagrar o tempo.
Agora, era jeito de gente indo.
Eram olhos mareados.
Era toda vontade de ficar.
Enfim, era varal vazio.
Era beija-flor fora do ninho.
Era silêncio onde não havia.
Era coração feliz.
Era oração.
Era gente dali.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Buenos Aires, 30 de Abril de 2012.


Buenos Aires, 30 de Abril de 2012.

Há poucos dias de completar um ano de Buenos Aires. E já não caminho com o pé machucado, já não me confundo nas palavras e não falo ‘malas palabras’ sem saber. Já posso falar como são as quatro estações por aqui. Já tenho meus lugares preferidos, mas uma infinidade a conhecer. Meu número de telefone já sei de cor. Quero me desfazer de pelo menos 40 Kg coisas que tenho em malas, pois já conheço o clima e as roupas e objetos que uso. E cada dia mais sei que ‘menos é mais’. Em um ano já estou no meu quarto endereço e talvez me venha o quinto. Tenho amigos de infância nessa terra que me acolheu e me repeliu várias vezes.

Em um ano quero me apaixonar de novo por essa cidade. Depois do tempo de festa/férias no Brasil, foi como se tivesse revisto um amor antigo, Belo Horizonte, e isso fez balançar a estrutura do relacionamento que vinha tendo com a vida porteña. Certo que meu coração gosta mesmo é de amar. Mas paixão…essa dá e volta e revira. Aí é esperar para ver se a paixão vinga de novo. Mientras tanto, Buenos Aires é passível de enamorarse.

Um ano passa rápido. Mais outro ano passará tão rápido quanto. E a saudade serviu de alimento para Outono, Inverno, Primavera e Verão. E a tecnologia serviu para dificultar que a saudade seja sentimento maior. A distância vem também para se conhecer no meio de um mundo que não é seu e você no máximo é um passageiro disso tudo. Mudar ajuda a organizar essa bagunça que pode ser sua cabeça e colocar a prova que cozinhar, lavar vasilha e estar sozinha são ótimas terapias. Aqui, descobri que solidão é coisa que se pode optar. Foram poucos os tempos de solidão, e estar sozinha as vezes é uma maravilha.

Estar há um ano por aqui me deixou mais paciente. A convivência com pessoas com outras criações, outras culturas, outros tudo, te deixam mansa e forte. Você aprende que não pode dar um cutucão quem está ao seu lado comendo de boca aberta. E sabe que se não conseguir ficar quietinha, na sua, é possível se se concentra e abstrair. E que quando alguma coisa não dá, não dá. E que mesmo assim perseverança se consegue sem se fazer estrondos.

E nesses 12 meses uma paixão virou amor. Luis Alberto Spinetta me arrebatou. O conheci pelas mãos do meu irmão, que uma vez mais me presenteou com a música, no caso, esse argentino, que quando me apresentou, não fazia ideia teria um dia uma vida nesse lado de cá. E o escutei aqui com uma constância tamanha que me deixou mais feliz quando a melancolia e a alegria me visitaram. O vi em programas de televisão, o escutei com amigos daqui em dias de pura música quando nos encontramos para escutar discos e eles tocavam para mim notas e cantavam melodias do “Flaco”, como Spinetta é carinhosamente chamado aqui. E quando eu estava aí em fevereiro, esse muchacho de ojos de papel se foi e me despedi dele como se fosse um amigo próximo, com uma tristeza parecida. Ontem fui à um show do Pedro Aznar em homenagem ao Spinetta. A avenida Sarmiento com 50 mil pessoas era puro silêncio.

Emocionante. E iluminou aquela noite, quando eu já era da cidade e gritei junto com os meus agradecendo a presença do Flaco nessa vida. E assim vivo já o frio úmido de Buenos Aires, que me esquenta em momentos como esse. Te deixo uma música que me convidou ao amor e me faz tentantiva de repaixonar.

“Ya lo estoy queriendo. Ya me estoy volviendo canción...”

Bitocas minhas.

Maria

y
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=-6tGDgkzHb8

Buenos Aires, Março de 2012.


Buenos Aires, Março de 2012.

Bom, essa carta foi tecida por alguns dias. E enfim, escrever é isso também: costurar…mesmo quando nos falta a linha ou a agulha. Hoje já não escrevo mais do chão do quarto, como no início dessa jornada. Passados quase 11 meses de vida do lado de cá, muita coisa mudou. E vai mudando mesmo. E muda também porque na trajetória vim e fui. Depois de tudo – ou quase tudo que te contei sobre os olhares de viver aqui, há um sentimento que não sei se alcança a palavra.

Quando cheguei, bem como você já sabe, era frio naquela época, eu era “sozinha” e escrever era uma ótima companhia. Cheguei aqui em Buenos Aires dessa vez no início do mês, pela terceira vez. E dessa vez fazia muito calor, já tinha o endereço certo e o melhor caminho traçado para levar as malas o mais rápido. E já não escrevo mais sentada no chão. De todas as vezes essa foi a viagem mais tranqüila. Em poucas horas – de SP à BsAs foram duas horas e meia e eu estava na capital argentina. E com um espanhol capenga depois de dois meses de férias falando nosso dialeto mineirês. Com esse castelhano entrei no taxi e pedi pra seguir ao meu endereço. Taxista é uma classe que gosta de conversar, né?! E tratando-se de Buenos Aires vale a regra que não se deve falar muito quando se é estrangeiro. Sem generalizações, juro. Nesse caso, mesmo podre de cansada e sem muita vontade de conversar, fui estreitando o laço com o motorista e deixando claro que eu vivia aqui para que não me passasse a perna. Salientei que meu espanhol estava “hecho mierda”. Muito educado me diz que estava mais portenha que brasileira. Mentira. Com a cara queimada de sol e o sotaque duro, eu podia ser tudo, menos portenha. Enfim, Rubens e eu fomos conversando até a porta de casa. E mesmo quando tudo lhe parece estranho – afinal voltar depois de meses de férias (intensas) é estranho.

Entro em casa e lá estava Charlie, namorado francês de Julieta. Ele que morava no Brasil e falava um português raro, me recebeu falando espanhol, ainda raro, e me apresentou ao seu amigo no Skype (em francês). Ou seja, não bastasse eu chegando “meio perdida”, sou recebida em casa em francês. Julieta chega algum tempo depois e começa a falar em inglês com o francês. Fiquei tonta e resolvi ir desfazer a mala no quarto.

Por aqui, não sei ainda ao certo se em Buenos Aires ou dentro de mim, as coisas soam estranhas. Está diferente a volta, as árvores e o céu não são mais os mesmos. E talvez não seja eu mesma nesse lugar. Algumas coisas chegam para mudar, né?! . E por mais que possa parecer, eu não sou a melhor das pessoas paras mudanças.. Um dia achei que fosse. Mas custa. Custa uma saudade, custa um coração amanhecendo meio capenga, meio apertado. Custa uma tarde de céu nublado mesmo quando o sol arde. Arde e nubla dentro. Algumas coisas vão mudando aqui. Já há a possibilidade de uma nova casa, de um novo trabalho, projetos que vêem e brindam essa nova trilha. E aí a saudade vai esmorecendo, o dia vai ficando mais lindo, o espanhol saí com mais facilidade, as conversas no ônibus voltam a ter som. Organizar as coisas por aqui, significa agora, deixar um pouco de lado os últimos dois meses aí. Que sim, foram lindos e não se engane, está tipo tatuagem. Tudo sempre estará à flor da pele. E seguir por acá não é o mesmo que esquecer. É só mesmo dar espaço. Aí tudo vai se ajeitando.

E aí me vejo no reencontros, os amigos que te esperam, os novos projetos que “te põe pilha”. E um deles queria te contar. Desses encontros que só a vida, num mistério profunda te dá, resolvemos fazer dele um coletivo. Um coletivo de gente que se juntou aqui. E aí que vamos juntar o trabalho de cada um fazer um negócio. Vai que chega aí um convite em breve. Vai que…E desses intercâmbios, sugeri que começássemos a ver um filme uma vez por semana. Um filme de cada país que nos gerou. E aí que hoje, fomos ver Mutum. Além de querer muito rever esse filme – faz uns quatro anos que o vi pela primeira vez no cinema, me instigou uma curiosidade da legenda em espanhol e a reação do povo. E aí que é isso, é redundante. Sentimento é universal. Pode ser filmado em um lugarejo sertanejo, perdido no meio do mundo, que ali vai ter uma história que te arrebatar. E eu chorei de novo com o encontro, com o Thiago e com o Campo Geral. Foi lindo dividir com os amigos mexicanos, colombianos, argentinos isso.

Comecei a escrever essa carta no segundo dia da chegada. Talvez seja uma das únicas cartas que escrevo por partes. A chuva deu o ar da graça na segunda-feira. Molhou o Março que molha geralmente molha aí. E hoje, já com duas semanas quase de ‘retomada’, a correria já existe e me dá uma pausa para vim te contar um bocadinho das coisas do lado de cá. Vou daqui esperando a próxima manifestação em alguma rua e te escrever a próxima carta.

Saudade.

Maria

Buenos Aires, 4 de Dezembro de 2011.


Buenos Aires, 4 de Dezembro de 2011.

Por pouco não escrevi 4 de Primavera. Um lapso corrigido a tempo.
Chegado ao mês sete aqui. Dezembro chegou. E que alegria é dizer mais de meio ano vivendo aqui. Seria essa a sétima carta? Bom, não sei. E também nem importa muito. Não sei se você chegou a ler todas essas linhas que enviei nas "cartas". Cheguei a esse décimo segundo mês do ano - preciso dizer que minha mãe sabiamente disse que devia se chamar Dozembre, como achei incrível, precisei compartilhar. 

Enfim, chegamos ao último mês do ano e tô aqui pensando o que posso contar. E na verdade, tem muitas coisas, a vida aqui por mais que você não faça "nada" em um dia, ele é capaz de ser um dia altamente interessante. E isso nem precisa estar em Buenos Aires para reconhecer. 

Você provavelmente deve ter um tanto de coisa para contar e nunca me contou. A verdade é que tô arrumando a mala. E acho essa a pior parte de uma viagem. Porém agora, mexendo nas minhas coisas aqui, fui ver o que levo ou não. E quis deixar algumas coisas que ficaram á minha vista todo esse tempo e que ficarão. Meus bilhetinhos, cartas, fotos, o ursinho que a Lia mandou para mim de Luanda, a caixa que recebi da Giovanna com meu cachecol - tive que deixar ele guardado agora, pois fazem 30 graus com uma umidade  que abafa, estranho. E aí vi as cartinhas que minha mãe me enviou, a lista que fiz quando meu pai veio me visitar...e aí um carinho tão imenso de tudo, 'inscluisive' seu, que quis adiantar a carta. 

De tudo, quero dizer mesmo, que cada suspiro gerado por um beijo, abraço, silêncio...cada suspiro bom desses, me ajudou a andar com uma bota imobilizadora, suportar o frio, tomar chuva no meio da rua sem guarda-chuva, nos primeiros dias que continuam sendo os primeiros cada vez que ouso ir ver algo novo. E aí que falar do último filme que ví, o escândalo na tv, o calor portenho, os vizinhos, o choro cantando um Mantra, as reformas nas ruas...não fariam tanto sentido agora. Talvez na próxima carta ou tete-a-tete, pois tô chegando. Sim sim. Desce com o copo que a conversa vai ser longa.

Buenos Aires, 5 de Novembro de 2011.


Buenos Aires, 5 de Novembro de 2011.

Dias de calor. Começar a sexta carta falando do clima é quase obvio. Mas, desculpa, é inevitável. Ontem choveu a beça, no entanto reconhecia a chuva: daquelas que anunciam o dia ensolarado do dia seguinte. Eis que! E assim foi recebido meus seis meses de vida portenha. Sim, inacreditável, né?! Lá se vai um semestre, meio ano de vida aqui. A verdade é que esses seis meses foram mais para você que para mim. Confesso que desde novembro do ano passado sabia da possibilidade da minha vinda. Arrumando “as caixas de cartas”, vi que há um ano mais ou menos recebi a tal mensagem falando do mestrado que hoje faço. E no dia que me dei conta e quis me inscrever, andei por Belo Horizonte quase com um tom de despedida. Fui a pé do trabalho ao outro lado leste da cidade – de sul a leste, olhando cada rua, estrela, janela, rua, cruzamentos, as pessoas, tudo, como “humm, talvez fique um tempo sem ver tudo isso!”. A verdade que o belo horizonte não saiu de mim, ainda que sinta um bom ar, minhas Gerais não escapuliu dos meus olhos. Assim como você que por aí estão. E agora, escrevo essas linhas com a audácia, escutando Nara cantando en castellano. E aí te conto como foram os dias últimos.

Bom, que Buenos Aires tem pelo menos uma manifestação por dia, isso todo mundo já sabe. Eu passo por algumas toda semana. No entanto, eu participei de duas muito importantes no último mês. Sem muito planejar, cruzei por elas. E entrei. Éramos eu e meu pai, ele que junto a minha mãe, me apresentou e nos levou, eu e meu irmão, para as primeiras aglomerações políticas da minha vida. Desde que me entendo por gente estive em uma. Desta vez, éramos nós dois, pai e filha na capital argentina, passeando e por “razão” dos cosmos, estávamos no lugar certo, na hora certa. A primeira, um ato por um ano da morte do estudante Mariano Ferreira. Um argentino que foi morto durante a reivindicação junto a classe ferroviária e foi baleado. Cerca de 200 mil pessoas avançavam em marcha a avenida de Mayo. Gritos e cantos por justiça fortalecia a manifestação. Eram diferentes grupos sociais. Estudantes, professores, médicos, trabalhadores de áreas distintas. Um dia te mostro o vídeo que fiz.

O segundo evento foi a comemoração por a reeleição da Cristina Fernandes de Kishner. Eram milhares de pessoas, jovens, crianças, pais e mães com seus bebes e idosos. Hora cantavam o nome de Cristina, outra, o nome de Néstor, que morreu há um ano. Mais uma vez emocionante. Eu e meu pai no meio da multidão compartilhando mais um momento político marcante. Muitas bandeiras. Um pronunciamento que eu cantei junto com meus "novos compatriotas". Que Deus nos proteja! Que Nossa Senhora da América Latina esteja com a gente!

E vestida disso tudo, fui continuar no dia seguinte, meu processo de legalização. Por Deus, quanto boliviano, paraguaio, peruano. Quanta cara de índio. Horas e horas, todos esperando o mesmo. Ali, entendi que definitivamente, Buenos Aires é a capital da América Latina. Nós, Brasil, somos maior e agora mais poderosos que nunca, mas por questão do idioma, Buenos Aires é destino para aqueles acreditam em uma oportunidade “melhor” na vida. Ponto máximo talvez seja a educação que seja um convite tentador, já que escola e universidade é gratuita. Entre mil e uma contradições, nós, aqui estamos.

São seis meses e algumas vezes tenho a sensação de sempre ter estado aqui. Não fosse pelo fato da sensação/sentimento que tenho todos os dias, de curiosidade, de olhar pela vigésima vez uma paisagem e ainda sim ela me parecer muito nova, não diria que são mais de 300 dias aqui. Ah, o sono e o despertar também são confortáveis. Mas todos os dias, TODOS, quando saio a rua (ou escuto meus vizinhos brigando já de manhã), penso: “é mesmo, estou na Argentina!”.

Aqui tenho levado a ferro e fogo a mineiridade. Sabe aqueles nossos almoços em casa, em que a gente só sai da mesa às nove da noite?! São assim. Convido os amigos para vir em casa e vamos de cachaça, aperitivo, almoço, Sobremesa, café, conversa, risos, música, café, biscoitinho… e aí meus oim enchem d’água: não tinha broa de fubá!

Lembra da banda que mandei a música na última carta? Pois bem, fui ao show deles essa semana. Onda Vaga. Incrível! Ah e vi dois filmes argentinos interessantes: El Estudiante e Medianeras. Cada um especial a sua maneira. Se der, os veja. E a vida tem sido assim, de estudos – uma sorte estudar teatro e cinema que esses são sempre meus “deveres de casa”. E aí gente aproveita um dia lindo e vai para a praça ler e tomar mate. Ou não, vai ver a cidade de uma terraza diferente. E aí, encanto vai, encanto vem. E em mais um piscar de olhos, passa mais uma semana, um mês, um ano. E mais num piscar de olhos a saudade vai virar abraço e beijo.

Maria

Buenos Aires, 07 de Outubro de 2011.


Buenos Aires, 07 de Outubro de 2011.

Ei!
Uma chuva hoje. Dessas que te enche de preguiça e muda por um instante seu olhar pela janela. Vesti meu aparato para o clima: galochas, casaco impermeável, guarda-chuva e anti-frizz para o cabelo. O vento quase carregou meu guarda-chuva azul. Ficou virado para cima. Suei para segura-lo em minhas mãos. Misericórdia! Imagina que tenha dormido a tarde, né?! Pois não. Hoje não cumpri com a siesta. Aliás, tenho a evitado. Comecei a arrumar a casa, escrever, lavar vasilha, enfim, fiz tudo para que o delicioso repouso da tarde não vencesse. Hahaha

Essa semana comemorei cinco meses de vida em Buenos Aires. Para mim, parece muito mais. Algumas vezes tenho a sensação de sempre ter estado aqui. Não fosse pelo fato da sensação/sentimento que tenho todos os dias, de curiosidade, de olhar pela vigésima vez uma paisagem e ainda sim ela me parecer muito nova, não diria que são mais de 300 dias aqui. Ah, o sono e o despertar também são confortáveis. Mas todos os dias, TODOS, quando saio a rua (ou escuto meus vizinhos brigando já de manhã), penso: “é mesmo, estou na Argentina!”.

Minha semana de comemoração foi rotineira e interessante – sim, as duas palavras podem viver em completa harmonia! Fiz almoço em casa para receber Pablo. Ai que delicia. Abri aquela garrafa de cachaça que trouxe daí. Ah, pero muy rica!!! Fiz feijão rajado, arroz branco que há muito não o fazia, salada de quinoa, farofa e aquele assado de abobrinha. Não tinha mais o queijo Minas que ganhei da Aline quando veio. Se não tinha deixado para a sobremesa com doce-de-leite. Essa parte, inclusive, é uma briga entre u e Pablito. Eu insisto que o doce-de-leite de Minas (de Viçosa) é mais gostoso. Não que o daqui não seja. São diferentes. Mas ele não acredita que nem bom seja. Yes, nós temos leite! Enfim. Mas representei a mineiridade muito bem. Sabe daqueles nossos almoços em casa, em que a gente só sai da mesa às nove da noite?! Foi assim. Cachaça, aperitivo, almoço, Sobremesa, café, conversa, risos, música, café, biscoitinho…e aí meus oim encheram d’água: não tinha broa de fubá!

Há muito queria ver uns filmes que finalmente chegaram ao cinema aqui. Acho que sou a estudante de cinema que menos vai ao cinema. Tirei a barriga da miséria e lá fui eu.  Vi “Arvore da Vida”, belezura poética. “El Estudiante”, filme argentino novo, bem bom também, claro que com outro viés. Está muito bom para conhecer onde estudo, já que foi filmado na UBA. Lembra quando te disse que onde eu estudava parecia um D.A da UFMG 30x mais cheios de cartazes. Diretório Político em todo o prédio e política feita ali mais que aulas assistidas. Ah, Buenos Aires!!! Bom, e por ultimo (?), assisti a “Pina”. Certo que estou sem fôlego até agora. Quando chegar aí não deixe de ver, pelo amor de Deus! #eudramaqueem. Wim Wenders é um ser para ser amado. Meu Deus!!!

Deixo um beijo.

Buenos Aires, 27 de Setembro de 2011.


Buenos Aires, 27 de Setembro de 2011.

Eis que chego à minha terceira estação aqui. Finalmente chegou a Primavera. E conto a você que é impressionante como a paisagem já muda. A árvore em frente a minha casa, mais precisamente, que está justo em frente a janela da sala de casa, que parecia morta, todos os galhos secos, ela, que já não tinha muita cor, a não se os passarinhos que iam namorar lá todo dia, agora já começa a saltar ramos verdes. A natureza ali bem debaixo dos meus olhos. E assim estão as veredas – calçadas, cheias de árvores frondosas todas exibidas se mostrando lindas pra gente. E aí, você passa por uma das 987 praças que estão espalhadas por Buenos Aires, cheias de gente. Crianças correndo, velhinhos tomando sol, jovens se encontrando. O silêncio do inverno está indo embora. Eu que estava sedenta pelo calor, ainda observo de longe, sentindo a onda do clima, como dizem aqui.

Mas é uma beleza, hei de confessar. Talvez nada me deixa tão feliz quanto o sol. É bem sabido que sou uma calanga por natureza e se eu pudesse ficava aí, namoradinha com sol. Pois além de muito branca e a camada de ozônio não tá de brincadeira, a vida corre e eu passo de raspão do solão.

Há coisas para fazer. E meu luxo de ficar ali quietinha, adquirindo energia solar para o resto do dia, não passa de uns minutinhos durante o caminho rotineiro. Falo só mais um pouco da Primavera, prometo. Você precisa ver como ela é recebida aqui. Todos os lugares tem faixas de boas vindas, todas as pessoas ao primeiro dia já estão com flores nas mãos, sejam porque lhes deram, seja porque compraram em alguma floreria – detalhe para o fato de existirem muitas, muitas, floriculturas (que é chamada aqui de floreria) em todos os lugares. E digo mais: não é só agora não. Elas são várias e são como bancas, abertas 24 horas!!! E todos nesse dia lhe desejam “Feliz Primavera”, tal qual a celebração do Dia do Amigo. Pois bem, a dita cuja chegou, meio tímida, é verdade, pois no Segundo dia, já caiu a temperatura, 8 graus, choveu, e da-lhe tirar o casaco e a botinha do armário. 

Mas eis que já amanheceu um dia lindo, azul, e já vejo meus braços e pernas for a de casa novamente. E um convite para tomar uma caipirinha. Digo porque os portenhos acham que brasileiro toma caipirinha todo dia, até no café da manhã. Aí para te agradar ou sei lá o quê, falam de caipirinha, praia e queijo quente. Eu, dou corda.

Ainda que seja tão comemorada assim a nova estação, não vejo tanta felicidade assim da parte dos nativos. Ok que estamos recém primaverados e não posso ousar tirar uma conclusão tão séria como essa. Mas sinto que eles gostam do frio. Muito cá entre nós, tenho achado estranho não usar minha bota vermelha.

Dos hábitos que reforcei aqui, foi o de ler jornal todos os dias. Mas agora são quatro. Não saio de casa sem antes ler um par de notícias e ver a previsão do tempo. Dependendo do meu humor, me arrisco a ver meu horóscopo. E cavuco notícias, viu?! Ave Maria. E quando tenho a tarde livre, me arrisco a ver o noticiário. Não muito diferente das tardes televisas brasileiras, aqui tem notícia de morte, seqüestro, escandalos com famosos etc e tal. Na tv aberta aqui passa a TeleSur. Aproveitei o dia de folga na última semana e vi/ouví a participação de alguns presidentes na reunião da ONU. Hahahha…. Sabe que TeleSur tem sua base maior na Venezuela, né?! E haja informação do Hugo Chavez. Houve um ato ecumênico em Nova York, onde estavam várias pessoas, entre elas o presidente boliviano Evo Morales. E qual não foi a surpresa? Chavez ao telefone ao vivo participa do ato. E falou com fulano, com ciclano…um bafuá. Isso tudo dentro da igreja. Muy gracioso! Muito moderno. Mas achei bom demais o discurso da Cristina (Cris Kishner). Bom demais é um exagero. Mas ela falar que o Velho Continente precisa com urgência a saber lidar com a crise, sobretudo, financeira que têm passado, completando o discurso da Dilminha, dizendo que eles/nós, podemos ensinar muito, afinal, ô nós que vivemos crises. E uma tal lá dando conselhos para Argentinas, Brasil e afins. A mesma tal (pessoa que agora esqueci o nome) deu conselhos para Grécia no ano passado. Palmas!

Aqui as últimas repercussões foram a absolvição do Carlos Menen, ex presidente que respondia por o envolvimento com financiamento de armas e corrupção; uma mulher, que divorciada do marido há algum tempo, quer usar o semêm congelado dele para engravidar, ele a proibiu, pois não há motivos plausíveis e ele não quer filho com ela (!), a mulher recorreu e a justiça a autorizou a usar (mas tá quente o negócio, não se fala em outra coisa) e o Mundial de Rugby, que não me pergunte o que é. Soube há pouco que é um esporte e um êxito da Argentina. Entre outras coisas como o terrível acidente com o trem aqui no bairro de Flores. Foi imensamente terrível mesmo. Muito perto do campus que estudo.

Faz tempo que não escrevo, né?! Nem sei muito mais o que contar, o que é novo ou não. Bom, esse mês de Setembro foi comemorado o mês do Brasil na Argentina. Muita coisa passou por aqui. Entre ellas uma festa na rua. Fubá demais. Devia ter chamado Porto Seguro Day. Três bolinhas de pão de queijo, 10 Pesos! Baiana tomando mate e uma banda cantando a música que dizem ser uma das mais famosas do Brasil: “ô Mila”. Entre os festejos, houve dentro do Festival Internacional de Literatura de Buenos Aires homenagens/mesas sobre literatura brasileira. Me programei para ver as falavam de Machado de Assim, Guimarães Rosa e Clarice Lispector. Ah, mas queria muito saber o que os argentinos e os demais vizinhos de língua hispânicas tinham a dizer sobre escritores brasileiros muito singulares. Tomei a tarefa quase como guardiã. Haha… O fato é que depois que me mudei pra cá, percebi (mais) a importância da nossa língua e me dei conta da veneração que os argentinos tem pelo Brasil e sobretudo pela arte. Durante esses dois dias que estive lá no Festival, mais ainda. Vi o Grande Sertão Veredas traduzido. Ainda não o comprei, mas o paquerei, passei por páginas e curiosa em demasia, queria ver como fizeram para traduzir o intraduzível. Não tenho resposta ainda para dar, a não ser que eles explicam o que é Jagunço, e que virou Yagunzo. E foi interessante ver a sala cheia em um sábado a noite, gente de todas as idades e lugares, escutando análises e contos de Clarice Lispector. Feliz de mim!
E como não poderia deixar de ser, eis mais uma pérola dessa que vos escreve. Dentro do ônibus, eu e Julieta. Vejo um cartaz de uma festa que tinha um nome chamativo, amor alguma coisa, não lembro ao certo. Aí Juli diz: “Essa festa aconteça em um antigo prostíbulo”. Eu: “Igual a Casa Rosada?”. Obvio que com meu tom de voz. Pessoas se viram para ver quem conversava. Explico: Confundi Casa Rosada (a sede do governo Argentino) com Casa Rosa, anti puteiro de luxo no Rio de Janeiro, em Laranjeiras, que hoje é um lugar que acontece festas (ótimas) e como Juli já morou no Rio, sabia ao que me referia. Anfam, entre conchas, cajetas e Casa Rosada, salvaram-se todos.

Te mando um beijo. Feliz Primavera!

Maria